sábado, 23 de junho de 2012

Austeridade em Portugal, game over ou não?




Numa perspectiva cínica a notícia sobre a eventual derrapagem orçamental comunicada por Vítor Gaspar não deixa de ser, aparentemente, uma boa notícia. Simplesmente pelo facto de, esta derrapagem pelo lado da receita, dar entender que a administração central chegou ao ponto em que o aumento dos impostos (em especial do IVA que, no mês de Maio, caiu em 2,8%) não é coincidente com o aumento da receita, já que, o consumo persiste em contrair-se e as medidas de crescimento são insuficientes para reverter a situação, não sendo pelo simples facto que não beneficiam o consumo interno.

Desta forma, o governo, de modo a cumprir o défice de 4,5% para este ano, e consoante os dados noticiados aqui, apenas tem, em meu entender, novamente aparentemente, cinco margens de manobra:

1) Ou encara o facto da queda na receita dos imposto indirectos (que, por serem os mais universais e "cegos" são, também, os mais injustos)  como uma oportunidade de aprofundar a distribuição equitativa dos esforços de consolidação procurando afectar os rendimentos de família ou de capital mais elevados;

2) Ou persiste na redução do desperdício, o que requer um esforço energético de racionalização das instituições públicas, salientando que, tal política, já tem surtido bons efeitos (como o facto da compra de bens e serviços ter diminuído 7,5%). Sendo que, reduzir o desperdício não é o mesmo que reduzir os custos laborais, quanto mais, demitir trabalhadores;

3) Ou o governo estende o seu plano de privatizações (na procura por receita que já não é possível arrecadar pela via mais fácil, o IVA) e persiste no encerramento de dadas instituições e serviços de capital público, desbaratando, deste modo, o património nacional (o que, só é sustentável, do meu ponto de vista, ideologicamente); 

4) Ou corta, ainda mais, nas despesas com a Segurança Social, p. ex., restringindo/dificultando os critérios de acesso ao subsídio de desemprego (reduzindo, p. ex., o tempo de direito de usufruto) ou o seu valor nominal;  

5) Ou aprofunda a política de policiamento e controlo quase até ao limite onde crime e coacção se tendem a confundir no tempo e no espaço, o que condiciona, como evidente, a liberdade dos cidadãos.  

De qualquer forma, apesar do esforço aqui empenhado em esclarecer as cinco possibilidades ao dispor do governo para reverter a situação e atingir o seu objectivo em termos de défice orçamental, temos de ter consciência que as três primeiras necessitam de mais tempo para se realizar e surtir o seu efeito, não possível já em 2012 (e esse tempo só pode ser obtido da benevolência das instituições europeias e do FMI; o que conduz ao que o governo se nega a fazer: reestruturar a dívida) e as outras duas não são possíveis por risco de intensificação violenta dos conflitos sociais. Para além do facto de, sendo todas estas políticas de contracção económica, os efeitos esperados ao nível do consumo privado continuam os mesmos mas para pior. Assim, se não existir, de alguma maneira, políticas de emprego, ou de incentivo ao crescimento, que promovam o consumo interno, o nível das receitas fiscais, nomeadamente o IVA, persistirão em conservar-se ou diminuir ainda mais. 

Enfim, resta-nos esperar pelo Sebastião, que, numa manhã de nevoeiro nos irá salvar (em linguagem economês: resgatar).

Sem comentários:

Enviar um comentário